Biocarvão é tema de treinamento na UFLA com a presença de especialistas nacionais e internacionais

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Participantes visitam Laboratório no Departamento de Ciências Florestais

Há cerca de 20 anos iniciaram-se os estudos sobre Terra Preta de Índio, sobretudo na Amazônia brasileira, despertando o interesse da ciência internacional. Esses solos são caracterizados pela ampla disponibilidade de nutrientes como cálcio, magnésio, zinco, manganês, fósforo e carbono. E foi devido à altíssima fertilidade desses solos e à presença de carbono pirogênico em grandes quantidades que surgiu a inspiração para desenvolver pesquisas com biocarvão.

O termo biocarvão (biochar, em inglês) tem atraído a atenção de pesquisadores do mundo todo e também da indústria. De acordo com o professor Leônidas Carrijo Azevedo Melo, do Departamento de Ciência do Solo da Universidade Federal de Lavras (DCS/UFLA), as pesquisas têm confirmado que o uso de biocarvão pode ser uma alternativa viável para a reciclagem e sanitização de resíduos e melhor aproveitamento de nutrientes. “À medida que as pesquisas têm avançado no mundo todo, percebe-se que é possível desenvolver fertilizantes mais eficientes à base de biocarvão, além de materiais adsorventes para reter contaminantes em áreas poluídas com metais pesados”, afirma.

Participaram do evento os estudantes de pós-graduação, professores universitários, pesquisadores, representantes da indústria e de organizações não governamentais, vindos de diferentes Estados e instituições de referência
Participaram do evento os estudantes de pós-graduação, professores universitários, pesquisadores, representantes da indústria e de organizações não governamentais, vindos de diferentes Estados e instituições de referência.

Para tratar dessa temática, de 24 a 26 de agosto, a UFLA foi sede o II Brazilian Biochar Training Course – treinamento específico que apresenta os avanços da pesquisa sobre “Biocarvão”, linha de estudo em expansão na Universidade. Com a presença de especialistas nacionais e internacionais (Estados Unidos, Alemanha, Austrália e Holanda), o evento, sob a coordenação do professor Leônidas Melo, permitiu discussões estratégicas sobre a adoção e disseminação da técnica de uso do biocarvão no Brasil.

Entre os palestrantes, pesquisadores reconhecidos como referências na área, membros das principais redes de pesquisa em biocarvão no Brasil e outros países convidados: Álvaro Guedes Soares (SPPT Pesquisas Tecnológicas Ltda); Carlos Alberto Silva (DCS – UFLA); Etelvino Novotny (Embrapa Solos); Jenaína Soares (DFI – UFLA); Maria Lúcia Bianchi (DQI – UFLA); Paulo Trugilho (DCF – UFLA); Cláudia Maia (Embrapa Florestas); Wenceslau Teixeira (Embrapa Solos); Aline Puga (Embrapa Meio Ambiente); Thomas Kuijper (WUR, The Netherlands); Tatiana Rittl (Esalq/USP); Bruno Glaser (Martin-Luther – University Halle-Wittenberg, Germany). Além dessas apresentações, foram organizadas duas videoconferências com os pesquisadores Stephen Joseph (University of NSW, Austrália) e Kurt Spokas (U.S. Department of Agriculture).

Participaram do evento os estudantes de pós-graduação, professores universitários, pesquisadores, representantes da indústria e de organizações não governamentais, vindos de diferentes Estados e instituições de referência na temática. Essa foi a segunda edição realizada no Brasil, a primeira foi em 2015, na Embrapa Agrossilvipastoril em Sinop-MT.

Palestras internacionais

Professor Leônidas Melo (direita) durante apresentação do pesquisador Thomas Kuijper, da Universidade de Wageningen
Professor Leônidas Melo (direita) durante apresentação do pesquisador Thomas Kuijper, da Universidade de Wageningen

O pesquisador Thomas Kuijper, da Universidade de Wageningen – Holanda, traçou um resgate sobre a origem das pesquisas com biocarvão, destacando seus efeitos e considerando o seu uso como um investimento na fertilidade do solo em longo prazo (sítios arqueológicos com terras férteis há milhares de anos).  Ele destacou, ainda,
que o biocarvão deve ser fabricado com resíduos, para se evitar o aumento da pressão sobre o desmatamento de florestas. Em sua avaliação, a fase de comprovar a eficácia já foi superada, devendo agora a pesquisa se dedicar aos mecanismos pelos quais esses efeitos são produzidos.

O pesquisador Bruno Glaser, da University Halle-Wittenberg – Alemanha, também destacou a importância da reciclagem de nutrientes e a associação entre o biocarvão e a compostagem de resíduos. Entre as comprovações de sua pesquisa, a capacidade de armazenar o Carbono e Fósforo no solo, além de poder ser usado em pequenas doses na alimentação animal de forma preventiva, onde absorve toxinas e previne o uso de antibióticos.

O professor Alemão veio ao Brasil pela primeira vez em 1996 e de lá pra cá já somam mais de 20 visitas, a maioria das vezes para avaliar o potencial do biocarvão/Terra Preta de Índio. “Ainda não sabemos tudo sobre esse tema, penso que estamos desenvolvendo a aplicação do uso do Biochar, mesmo no Brasil”, reforçou.

Esses temas têm sido objeto de dissertações e teses desenvolvidas com a participação de diferentes departamentos, tornando a pesquisa ainda mais efetiva e multidisciplinar.
Esses temas têm sido objeto de dissertações e teses desenvolvidas com a participação de diferentes departamentos, tornando a pesquisa ainda mais efetiva e multidisciplinar.

O pesquisador destacou outra função do biocarvão, no tratamento de água. Neste ponto, Bruno Glaser considerou a atuação da UFLA nos temas ambientais, parabenizando a Instituição pelo reconhecimento internacional “Blue University”. Além de fazer elogios à estrutura e beleza da Universidade, o pesquisador sinalizou o interesse em ampliar as parcerias acadêmicas, ampliando as linhas de pesquisa e, consequentemente, a produção científica.

Resultados promissores

“O Brasil tem grandes potencialidades com biocarvão, devido à grande produção de biomassa

e geração de resíduos agrícolas, urbanos e agroindustriais. Porém, ainda precisamos desenvolver mais pesquisas e também a indústria para viabilizar o desenvolvimento de novos produtos que contribuam para o desenvolvimento sustentável da sociedade brasileira”, completou o professor Leônidas.

O professor aponta algumas características do biocarvão que devem ser ressaltadas: primeiro, ele pode ser produzido a partir de resíduos vegetais, como casca de café, resto de serraria, cascas de pinus/eucalipto, palhas vegetais, bagaço de cana, solucionando e dando valor aos resíduos de diversas atividades econômicas. Além disso, o processo torna o carbono em uma forma resistente, possivelmente por centenas ou milhares de anos (carbono pirogênico) que adicionado ao solo melhora suas características.

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Biocarvão: pesquisas avaliam inúmeras potencialidades

As pesquisas realizadas na UFLA tem enfocado o efeito sobre o pH do solo, a capacidade de reter nutrientes (Capacidade de Troca Catiônica – CTC), efeito estimulante da atividade microbiana no solo, capacidade de sequestrar Carbono e outros gazes, efeito sobre a disponibilidade de alguns nutrientes, capacidade de reter água no solo, mantendo-a disponível por mais tempo as plantas, sendo seu uso promissor em áreas de menor pluviosidade e apresenta efeito remediador de contaminações no solo, como a de metais pesados.

Esses temas têm sido objeto de dissertações e teses desenvolvidas com a participação de diferentes departamentos, tornando a pesquisa ainda mais efetiva e multidisciplinar.

A doutoranda Evanise Penido, estudante destacada durante intercâmbio no Ciência sem Fronteiras (CsF), defendeu o Mestrado com uma abordagem sobre o efeito do biocarvão sobre metais pesados no solo. Entre os resultados, a constatação de que o biocarvão tem a capacidade de adsorção de metais, atuando como um adsorvente verde no solo, em estudo realizado em área de mineração.

Texto elaborado com a colaboração do estudante Luiz Alberto Araujo da Silva – bolsista Proat/Ascom (cobertura e entrevistas). Fotos: Luiz Alberto Araujo da Silva.

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Participantes do II Brazilian Biochar Training Course – Universidade Federal de Lavras (UFLA)