Mestrado Profissional: A pós-graduação indo para além da Academia

Não há dúvidas sobre o papel da pós-graduação para a ciência brasileira, pois além de qualificar recursos humanos para a pesquisa, ensino e setor produtivo, esta é uma importante fonte geradora de conhecimentos, sendo assim capaz de impactar a sociedade por várias maneiras. A Capes buscando ampliar ainda mais a contribuição da PG, vem discutindo mecanismos que possam aumentar a inserção social dos programas de PG e como parte dessas ações realizou em São Paulo (Unifesp), um seminário especial, realizado no final de março. O seminário reuniu a diretoria da agência, convidados especiais e representantes de diversas áreas, representando a Ufla e também das Ciências Agrárias I e membro do Conselho Técnico Científico (CTC) daquela agência, prof. José Oswaldo Siqueira.

O enfoque geral das discussões foi definir o papel da PG na transferência de conhecimento científico qualificado para a sociedade, o que incluiu aspectos dos vários modelos de pós-graduação, com ênfase especial na modalidade de mestrado profissional (MP). O MP que tem um caráter estrito de formação profissional terminal, sendo este definido pela Capes há vários anos, por portaria, de 1998, mas que, não tem tido muita aceitação na PG brasileira, continuando sub-dimensionado. Apenas cerca de 7% (132 de um total de quase 2000 cursos de PG) dos cursos avaliados pela Capes, se enquadram nesta modalidade. Entretanto, a taxa de novos MPs é crescente, sendo estes em grande parte originados de programas acadêmicos. Em função desse crescimento real e interesse já manifestado por diversas universidades, a Capes decidiu promover uma discussão para definir políticas e procedimentos apropriados para esta modalidade de mestrado.

Segundo o prof. Siqueira, há apenas um MP em todas as Ciências Agrárias, pois esta área tem preferido o Lato Sensu (LS), destacando-se o caso da Ufla que é pioneira e líder nesta modalidade de PG. Ficou evidente no seminário a necessidade de uma avaliação rigorosa das vantagens e desvantagens do LS, sobretudo em decorrência da ausência de avaliação pela Capes nestes programas. O LS tornou-se um processo massificado, cuja eficácia na qualificação humana e na transferência de conhecimento, não pode ainda ser determinada de modo sistemático.

O MP é voltado para a aplicação do conhecimento e para objetivos profissionais, representando um meio específico de transferência de conhecimento para além da academia. Este deve responder a uma necessidade definida e objetiva, uma demanda específica e qualificada para o aprofundamento da formação técnico-profissional conquistada no curso de graduação. Deve formar profissionais pós-graduados, aptos a elaborar novas técnicas e processos, com desempenho diferenciado de egressos de mestrado acadêmico, que é pautado na geração e no aprofundamento de conhecimentos e técnicas de pesquisas e acima de tudo em uma preparação para o doutorado. O MP forma mestres para o exercício de profissões outras, que não envolvem docência acadêmica e pesquisa científica. O estudante de MP deve ser capaz de fazer uma análise crítica do conhecimento para solução de problemas e atender um mercado qualificado de trabalho, e assim incorporando mais realismo à PG. Apesar de bem caracterizado em sua finalidade, o MP precisa ser tratado com rigor, pois pode ser facilmente confundido com o LS, Especialização ou Residência. O perfil peculiar dirigido à formação profissional não implica em facilitação dos critérios e procedimentos do mestrado acadêmico e não corresponde a uma alternativa para formação de mestres de segundo padrão ou programa de exigência mais simples. Tem caráter próprio e não pode sobrepor-se ao mestrado acadêmico. A proposta de criação de um MP deve expressar de forma clara e direta a associação entre o ensino e aplicação profissional e deve surgir, preferencialmente, da demanda ou interesse comum entre o setor acadêmico e um setor não acadêmico com exigência de um perfil e tipo de qualificação pré-estabelecidas. O MP apresenta ainda outro aspecto interessante que é a capacidade de induzir o surgimento de novos campos de atividade profissional qualificada.

As discussões do seminário direcionam para a definição de um formato consensual, que resolva as questões conflitantes como: equivalência, financiamento do curso e pagamento de taxas escolares como ocorre nas instituições particulares, que já avançam nesta modalidade. O sistema público não pode cobrar taxas escolares, não permite venda de pacotes de treinamento e o carimbo de vagas; e como já definido pela Capes, há na necessidade de avaliação tal como ocorre com a PG acadêmica.

Nas Ciências Agrárias, o prof. Siqueira entende que há uma grande demanda potencial para esta modalidade de PG, visando a qualificação profissional atualizada de técnicos do sistema público federal, estadual e municipal, especialmente de fiscais e extensionistas; de técnicos para áreas de consultorias privadas, para a formação de jovens agricultores e empreendedores e profissionais para grupos empresariais do complexo agroindustrial brasileiro. Várias áreas temáticas ou especialidades tem demanda e natureza apropriadas à esta modalidade de mestrado como alguns exemplos a seguir: agricultura orgânica e familiar, cultivos florestais, recursos naturais, controle fitossanitário, fruticultura de exportação, floricultura e plantas ornamentais, ervas e plantas medicinais, insumos agrícolas, biotecnologia e biossegurança, inovação tecnológica no agronegócio, climatologia, rastreamento e certificação da produção e produtos, cultivos conservacionistas, vários campos da engenharia agrícola, da informática e da administração e das ciências aplicadas.

Embora não haja consenso entre as áreas de conhecimento, devido às peculiaridades destas no âmbito conceitual e da realidade nacional, o MP já é uma realidade no Brasil. O que parece certo é que este deve surgir de uma demanda qualificada e específica que determina o perfil do pós-graduando a ser formado e espera-se que os egressos tenham impactos positivos na sociedade. Além de trazer mais realismo à PG, o MP oferece várias vantagens, mas há também desvantagens deste em relação ao mestrado acadêmico, destacando-se: a dicotomia ou ruptura a um modelo já consolidado, a possibilidade de virar um LS, de sobrepor os tipos já existentes e seu forte viés de mercado. Do seminário saíram as bases para as diretrizes do processo de análise das propostas de cursos de MP e a sistemática de avaliação. Estas, na verdade são adaptações dos critérios e procedimentos adotados no mestrado acadêmico.

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