Espécie cavernícola brasileira descoberta por pesquisadores da UFLA está na lista “Top 10 New Species 2016”

O animal em sua troca do exoesqueleto, dentro de abrigo construído.
O animal em sua troca do exoesqueleto, dentro de abrigo construído.

Entre as 18 mil novas espécies de seres vivos descobertas nos últimos 12 meses, dez ganharam destaque internacional por serem consideradas as mais interessantes. Na lista das “Top 10 New Species” está a troglóbia brasileira Iuiuniscus iuiuensis (Crustacea: Isopoda: Styloniscidae) – um “tatuzinho” de cavernas descrito com a participação direta do Centro de Estudos em Biologia Subterrânea da Universidade Federal de Lavras (UFLA).

A avaliação das espécies descobertas é feita por um comitê de especialistas ligados ao Instituto Internacional de Exploração de Espécies, da Universidade de Nova York (International Institute for Species Exploration). Desde 2008, o instituto publica a lista das “Top 10 New Species”, sempre em 23/5, data de aniversário Carolus Linnaeus, considerado o pai da taxonomia moderna. Até hoje, 90 espécies já entraram para o ranking de destaques devido a atributos morfológicos, comportamentais, ecológicos e outras características de sua descrição. Dessas, apenas quatro eram espécies brasileiras, sendo que duas delas estão na publicação de 2016.

Esta é a primeira edição das “Top 10 New Species” com a presença de uma espécie cavernícola. O professor da UFLA e ecólogo Rodrigo Ferreira, que descobriu o tatuzinho de cavernas e estudou o comportamento incomum do crustáceo, ressalta a importância da cooperação nos trabalhos de pesquisa, para que se potencialize a qualidade do resultado final. “A descrição dessa espécie teve a colaboração de diferentes atores. Além da equipe do Centro de Estudos em Biologia Subterrânea da UFLA, atuaram a professora Leila Aparecida Souza (Universidade Estadual do Ceará – Uece) e o professor André Senna, na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Os dois últimos pesquisadores fizeram de descrição morfológica da espécie.

O destaque para as dez novas espécies mais interessantes tem o objetivo de sensibilizar a população mundial para a importância da biodiversidade e das coleções biológicas na conservação de animais, plantas e microrganismos.

A importância da descoberta, descrição e classificação de espéciesiuiu1

O ramo da biologia que se encarrega de descobrir, descrever e classificar as espécies é a Taxonomia, surgida no século XVIII. Desde então, mais de um milhão e meio de espécies já foram descritas. No entanto, milhões de outras espécies ainda permanecem desconhecidas e inacessíveis à ciência e à sociedade. Descobrir, catalogar e mapear as espécies que existem no mundo (bem como suas características) é considerado pelos pesquisadores como essencial para a compreensão da história da vida.

A informação taxonômica confiável é tida como fundamental para o gerenciamento de ecossistemas sustentáveis, com o intuito de alcançar metas de conservação. Cada nova espécie garante à ciência a geração de novos conhecimentos, que podem ter impactos em diferentes áreas. Por isso, é inquietante para a comunidade científica o risco de muitas espécies serem extintas antes mesmo de serem identificadas e descritas. “Nesse caso, tudo o que poderíamos ter aprendido com essas espécies será perdido”, avalia Rodrigo.

Um pouco mais sobre o “tatuzinho de cavernas” e sua descoberta

A troglóbia brasileira Iuiuniscus iuiuensis, além de ser uma nova espécie, determinou também a identificação de um novo gênero e uma nova subfamília. Isso porque os tatuzinhos de caverna possuem um comportamento nunca antes visto em seu grupo: a construção de abrigos feitos de lama. Tais abrigos, em formato hemisférico ou irregular, são construídos para que os organismos troquem seus exoesqueletos. No momento dessa troca, eles se tornam vulneráveis aos predadores, e por isso se abrigam nestas estruturas por eles construídas. Além disso, a nova espécie é única entre os seus parentes que habitam cavernas brasileiras. Eles possuem espinhos nas laterais do corpo, que podem ter evoluído em resposta à pressão de predação por peixes, que coabitam a caverna onde vivem.

A descoberta dos tatuzinhos se deu em 2007, em uma caverna localizada em Iuiu, sudoeste da Bahia (o nome do crustáceo da ordem isopoda foi atribuído como homenagem à cidade). Entretanto, o hábito de construir abrigos só foi identificado durante um retorno à caverna em 2010. Os pesquisadores da UFLA rastejavam pelo sedimento quando, acidentalmente, destruíram parcialmente um desses abrigos (que são exatamente da mesma cor do sedimento da caverna). “Foi então que percebemos o curioso e inédito comportamento de construção destes organismos. Passamos, a partir daí, a investigar esta descoberta”, relata o professor.

Rodrigo conta que os trabalhos de descrição de espécies têm trazido, cada vez mais, informações a respeito da vida, dos hábitos, dos comportamentos e status de conservação das espécies-alvo das descrições. “Por mais que alguns pesquisadores preguem a ideia que descrições taxonômicas são puramente morfológicas, e que outras informações (ecológicas, por exemplo) não caibam em trabalhos de taxonomia, qualquer informação a respeito de um organismo é extremamente preciosa”, avalia.

A descoberta do tatuzinho de cavernas foi relatada em artigo publicado na revista PLOS One, em 2015.

Para outras informações sobre as “Top 10 New Species”, acesse http://www.esf.edu/top10/2016/04.htm